domingo, 25 de dezembro de 2011

Carta

Queria eu escrever-te sem escritas,
deitar pelas mãos nuvens e orvalhos
como quem semeia nadas, assim de leves
e tão alados, música sem algemas
que ao papel a ferrem, sons esparsos
como vozes sussurradas nos fundos ameais
onde pé não pousa ou ouvido alcança.

Queria eu escrever-te brancas frases
que nem fossem munidas de palavras,
redigi-las em aragens ou carícias,
átomos de insubstância e tinta,
acordes desacordes com os tempos,
aroma impossível de japoneiro e o verde-
-criança duma seara em primavera.

Algum pedaço de alfabeto avulso
sacudir logo e embrulhar na seda
dum envelope azul-de-maré-cheia,
selar com borboleta num canto o destino.
Finalmente, levar aos Correios e dizer:

—Queira mandar, se faz favor,
para onde o mundo acaba.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

A horticultora insuficiente

Por non só ver se medran se non as nabizas e os repolos corazón de boi, plantei ervellas. Agora é así: de cando en cando, asexo na horta na esperanza de que asome o rebento dalgunha herba produtiva. Polo de agora, para o meu desespero, continúan a gañar as outras, as que só gasto dan na terra e no corpiño e nin cabra alimentan. E falando en cabras, o meu futuro veciño gañou xuízo (e eu perdín fedores), pois trocou o bravún no ar polas verzas en terra. E está bonito de ver o campo, cos seus regos dereitiños —que eu ben llos vin trazar a cordel— e as plantas de follas a secar ao sol a poalla de onte día enteiro. Díxome, amais (pena non acordara antes!), que cando quixese, podía apañar para un cocido. Vou ter que plantar un porco, logo. El será tempo?

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Só na boca o sal









Urbano Lugrís.
Mar dos argazos (1946)



Nesta prisión de ar contido, de mágoas,
rizóns e mastros sen vela, argazos
fosen os meus cabelos, nácara as uñas
de cunchas e os desexos meus,
dos ósos de náufragos mortos no sur
os meus ósos, de escamas e espiñas
vivas tamén os meus dentes vivos.

Cata o lenzo que me prende á proa,
mansa mortalla nas cores da serea...!
Non quero ser mascarón, nin reixas!
Quero é nadar arrolada entre anémonas,
marear os ventos ao lonxe das ribeiras
(xamais armas ao peito, nin aos ollos vazados),
unha illa ás veces e sempre horizontes.

Quero é tempestades, o pano negro fendido
no relampar quedo na nudez do océano,
e contento e azul ou verde, até cinéreo.
Non o norai de sombras que me amarra,
nunca este corpo de pau a abafarme as ansias!
Só nos labios un bucio, nin leme nin sextante;

só na boca o sal
                                     e no sal todos os mares.

_____________________
Homenaxe a Urbano Lugrís no 17 de decembro de 2011 pola Nave das Ideas (pódese descargar o libro, gratuitamente, nesa páxina)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

E o teu frio...

Nem imaginas o tamanho do silêncio
em que me abandonaste para todas as noites
e eu ainda, viste?, te deverei desculpar,
porque está muito frio e penso
que o teu frio será maior e incurável,
um frio igual ao da terra nua, húmida,
sob as palavras geladas que já não dizes.
Não há lume que me conforte as mãos,
enquanto desfio letras nos poemas
com que tecer um cobertor de ausências
para aconchegar o silêncio que me cresce
por fora e dentro do rosto cansado.

domingo, 18 de dezembro de 2011

A chávena vazia

Doravante o senhor Eduardo e eu partilhamos mesa na esplanada. Os muitos anos privaram-o de ouvido e tem o aparelho —explica, abanando a cabeça— a arranjar. Sem ele nada ouve. Mas vê, observa, entre cigarrilha e cigarrilha, quem vem (boa tarde), quem vai (tudo bem?). Um dia viu-me chegar, seguiu os meus passos encaminhando-se à uma das mesas para contemplar a friagem nelas instalada e fez-me sinal com a mão de me sentar, se faz favor, na dele, abrigada pela parede e as varandas do primeiro andar. Olhei-o nos olhos e misturei um obrigada e um sorriso na dose exacta. Sentei. Ele retirou a chávena do café vazia com o seu pires e dobrou o jornal que já lera para deixar espaço ao meu triste descafé cheio e à Pedras, ao romance em curso e às mãos que seguram as páginas enquanto por ele navego nenhures.

Não tarda, ele aproveitará a boleia do carro dalgum conhecido que sobe a encosta para poupar aos seus brônquios avariados o esforço do regresso à escuridão da casa, onde a mulher lhe morre devagarinho.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Espaço Ademar

Envoltório

Para a Ana Saraiva, a 9 de dezembro de 2011

Hoje não tenho prenda para te oferecer.
Fiquei à espera na soleira de casa
olhando ao céu: nenhum mar se via,
nem pianos de vela a sulcarem os instantes;
apenas me sobram garças que se abrigam no sul
das minhas mãos solitárias,
amieiros nus que morrem pelas margens,
um grasnido frio de corvo, véus rasgados de névoa
e os caminhos a que nunca achei fim.

Não tenho prenda alguma que te dê.
Foi por isso que escolhi para ti
o meu mais viçoso rebento de abandono
embrulhado em azul de águas
sobre um fundo de areias raras.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

De amor (tamén o alleo)

A Carlotte ten andado a enfiárseme na cama. En canto poño o pixama e me deito aparéceme ela con toda a tramoia do salón dun hotel de Weimar, onde conversa co doutor Riemer mentres eu loito contra as pálpebras que me caen, sen apagar a luz aínda, sen aconchegarme no cabezal, coa esperanza de continuar a ouvilos. Eles deseguida notan que eu xa non lles presto atención porque calan, agardan que abra de novo os ollos, que me centre outra vez no que me queren contar. Haberá quen pense que é deferencia comigo, que se resisten a privarme do relato das súas respectivas relacións con Goethe, que espreito con curiosidade perversa nas últimas horas do día. Eu, non obstante, teño a certeza de que é exhibicionismo. Consideran o seu un diálogo sublime que merece unha ouvinte dedicada coma min. Non se contentan cun falar abafado entre as páxinas fechadas dun libro. Que lle vou facer? Se lles aturo a fachenda, dígovos, é polo interese que me provoca a inevitable aparición do poeta. E por amor propio.