sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Por que não irei ser nunca escritora reconhecida

Por vezes ocorrem-me frases brilhantes, só que depois aparece uma corrente de ar e, miséria, perdem-se. Que sejam brilhantes as frases não quer dizer que iluminem as pessoas, como candeeiros na rua ou o sol. Não. Quer dizer apenas que dariam para escrever um poema, um romance, um ensaio, uma enciclopédia universal, talvez a história do mundo desde o princípio que era o verbo até ao fim que serão os mercados. Apenas isso. Essas frases brilhantes, silenciosas como relâmpagos no alto-mar, queimam nas pontas dos dedos, podem em casos concretos abrasar a pele toda das mãos e desatar um delírio místico. Há aquela tendência impulsiva, instintiva, a largá-las, como se fossem a travessa de comida que alguém demorou horas a preparar e colocou encima do fogão a lenha para evitar que arrefecesse, que chegada a hora nos passa com muito amor e luvas de cozinha para levarmos à mesa a dizer olha que queima quando já a travessa está no ar e é tudo um caos de fome e cacos impossível de evitar. Os convivas, com a água na boca e os olhos no chão, experimentam a mesma sensação de vazio no estômago do que eu na existência trás procurar embalde a caneta que está sem tinta ou o telemóvel que ficou sem bateria para anotar a frase que fugiu, sumindo nas trevas a magna obra que me iria dar o reconhecimento mundial mas que já não irei partilhar. É pena.

13 comentários:

condado disse...

Ía invitala a comer a semana próxima mais con esta memoria que se gasta seguro que como só...

Sun Iou Miou disse...

A semana que vén NON me toca comer, pero con esta memoria que (des)gasto igual como.

Jonas disse...

Pelos vistos, tens o 'reconhecimento mundial' em grande conta!
Vai comendo, anda!
;)

ella disse...

Sin saber qué dice: caneta, sumindo nas trevas, arrefecesse, os convivas...
La viola de este cuarteto tiene problemas con la partitura.

Anónimo disse...

As frases brilhantes poderiam ter levado sumiço, com o vento, mas ficou este texto, recheado de outras, não menos brilhantes.

Sun Iou Miou disse...

Ella:
*caneta = bolígrafo (instrumento para escribir en sentido laxo; propiamente, bolígrafo = esferográfica)
*sumir nas trevas = desaparecer en las tinieblas
*arrefecer = enfriarse
*convivas = convidados, comensales (derivado de "conviver" = 'convivir')

Sun Iou Miou disse...

Anónimo, nem imagina quantas grandes obras o vento levou. Hehehe.

Sun Iou Miou disse...

Ah, Jonas, ficas-te-me esquecido, peço desculpa.

É verdade, tenho em muito grande conta o reconhecimento mundial. E digo mais, se houvesse vida além deste planeta, teria em contíssima o reconhecimento universal. E se houvesse Deus (um, trino ou múltiplo) também teria o reconhecimento divino em conta. Não quero senão ter o mundo aos meus pés antes de eu estar aos pés do mundo. É para isso que nasci. Nota-se bem.

E vou comendo, ainda, e andando.

ella disse...

Pero, tienes el reconocimiento de los dioses que aquí vienen. ¿Te parece poco?

Jonas disse...

Que ridículo...!

Sun Iou Miou disse...

Todo me parece pouco, Ella. Quero unha coroa de loureiros (con nécoras).

É, Jonas, um ridículo horroroso.

Anónimo disse...

E não é só vento a levá-las. Há que contar com as grandes obras que ficam nas gavetas (agora nos computadores).

O vento, esse manganão
que levanta as saias às mulheres
e enche os homens de tesão...
Anónimo

Sun Iou Miou disse...

Ai, Anónimo, agora não é vento que as leva, mas os vírus informáticos e falta de cópias de segurança, ou como vocês dizem em bom português, de backups.

A tesão, essa com o tempo
também leva o vento.
Ficam as saias.